Tour de l’Avenir 2022, um confiável laboratório de estrelas
Muitos dos grandes passaram por aqui.
Muitos dos grandes passaram por aqui. A prova mais importante do mundo do escalão de sub-23 arranca esta quinta-feira, dia 18, e termina a 28 de Agosto. Quem ganhar já se sabe: vencerá uma grande volta. Assim dita a tendência. Cian Uijtdebroeks, Leo Hayter, Lenny Martinez ou nenhum destes?
Felice Gimondi. Joop Zoetemelk. Greg Lemond. Miguel Indurain. Laurent Fignon. Egan Bernal. Tadej Pogačar. Eis os sete vencedores do Tour de l’Avenir que também venceram a camisola amarela da Volta a França. Mas há mais, muito mais nomes de relevo — alguns também com vitórias em grandes voltas — que têm provas dadas como grandes nomes do ciclismo internacional: Marc Madiot, Charly Mottet, Bauke Mollema, Nairo Quintana, Johan Esteban Chaves, Miguel Ángel López, David Gaudu, entre tantos outros. Uma série de outros nomes, sem a vitória final na competição, também daqui tiraram proveito — Joseba Beloki foi o melhor trepador de 1998; Philippe Gilbert o corredor mais regular de 2003, apenas para nomear alguns e não provocar uma enxaqueca ao estimado leitor.
De alguma forma, para toda esta gente, é como se Avenir fosse a sua primeira grande bebedeira. Perdão: é como se aqui tivessem de passar antes do trampolim decisivo. No fundo: não existiam assim tantas pessoas no mundo que sabiam da existência de Tadej Pogačar antes do Tour de l’Avenir de 2018. A correlação directa entre este laboratório de estudo e vencedores de grandes voltas ou outros grandes feitos está há muito provada e deve — se não for por mais nada que seja por tudo o que foi escrito até aqui — fazer-nos ter dois olhos bem atentos e as antenas ligadas.
A 58ª edição da prova mais habitualmente conhecida como Volta a França do Futuro — por quatro anos não se realizou e num outro foi substituída por uma outra competição — arranca esta quinta-feira, dia 18 de Agosto, em La Roche-sur-Yon, e termina no dia 28, em Villaroger, onde quer encontrar-se o sucessor de Tobias Halland Johannessen.
A primeira semana é relativamente pacífica. Um par de chegadas empinadas — ou talvez seja mais justo dizer um par de chegadas de falso plano — que não deve impedir os principais sprinters de discutir os lugares cimeiros da classificação, a não ser que as etapas sejam muito atacadas ou corridas a um ritmo frenético. Depois, a partir a prova em duas metades, um contrarrelógio por equipas de 28kms entre o plano e o ondulado que deve servir para marcar as primeiras diferenças entre os principais favoritos. A sexta etapa, entre Saint-Amour e Oyonnax, podia ser uma clássica de pouca quilometragem: 124,6 quilómetros num constante sobe-e-desce e onde se percorrem cinco contagens de terceira categoria — a última delas, o Côte de Ceissyat são 3,5 quilómetros a 6,4% a apenas seis quilómetros da meta. Numa competição sub-23 esta é daquelas etapas onde um favorito distraído pode dizer adeus.
E as últimas três tiradas são duras mas duras: a sétima etapa coincide com a chegada em alto ao Col de Madeleine (15,3kms a 8%); na oitava chegam a La Toussuire (15,5kms a 7%, antes fazem a vertente mais mais longa do Col de Madeleine: 24,7kms a 6,1%); e na derradeira batalha, ainda que a chegada seja uma terceira categoria aparentemente inofensiva (4,9kms a 6,4%), têm a ascensão ao Iseran: 12,8kms a 7,3%.
![](https://www.falsoplano.pt/content/images/2022/08/2022-07-27_0523_Leo_Hayter_-Tour_Alsace-.jpg)
Como se pode perceber: não é brincadeira nenhuma. Espreitemos então os principais candidatos à vitória. Leo Hayter é, seguramente, um dos nomes mais temidos no pelotão. Em Junho, arrecadou o título da Volta a Itália Sub-23 — e, convém que se diga, na duríssima terceira etapa da competição deu praticamente cinco minutos a toda a gente. Leo, irmão de Ethan, e que devido a essa estupenda exibição saltou da Hagens Axeon Bermans para a INEOS Grenadiers (contrato até 2025) conta ainda com Samuel Watson, Robert Donaldson e Thomas Gloag como fiéis escudeiros.
Se a seleção da Grã-Bretanha pode ser vista como uma das mais fortes aqui presentes, não podemos ignorar o excelente bloco da França. Lenny Martinez e Romain Grégoire são seguramente dos trepadores mais dotados do Tour de l’Avenir 2022. Com provas dadas na equipa sub-23 da Groupama-FDJ — e mais uns atrevimentos em competições de elites — afiguram-se como dois evidentes candidatos à amarela, sobretudo se optarem por trabalhar em dupla.
Por falar em dupla, muito cuidado. A Bélgica é outra das seleções que merece respeito. Têm segundo — Lennert Van Eetvelt — e quarto — William Junior Lecerf — à geral da Volta a Itália Sub-23, dois dos melhores corredores do escalão sem qualquer margem de dúvidas e membros da equipa de desenvolvimento da Lotto-Soudal. Van Eetvelt foi, aliás, dos poucos que conseguiu reduzir distâncias para Leo Hayter durante o Giro Baby — saiu da tal terceira etapa a 5:56 na geral e terminou a prova a 2:12, com direito a vitória no Colle Fauniera onde espetou 1:16 a Lenny Martinez. Mas calma, a Bélgica não acaba por aqui. Falta aquele que é talvez o grande candidato à vitória final do Tour de l’Avenir: Cian Uijtdebroeks. O prodígio que fez 19 anos em Fevereiro, vencedor da Kuurne-Bruxelas-Kuurne júnior em 2020, que este ano só correu em elites ao serviço da BORA-Hansgrohe e que tem como amostra resultados como um oitavo lugar à geral da Volta a Noruega — Remco Evenepoel ganhou a prova —, um terceiro lugar no Sibiu Cycling Tour — apenas atrás de Giovanni Aleotti e de Harm Vanhoucke — e dois top10 em etapas na Settimana Internazionale Coppi e Bartali. Uijtdebroeks pode não ser o melhor trepador em prova, tudo certo, mas é, seguramente, um dos mais completos corredores que se apresentam à partida. E com um ano a correr entre elites, ou seja, mais experiência que a grande maioria dos seus adversários.
A estes, acrescentem-se Mathias Vacek (Chéquia; Trek-Segafredo), o único corredor presente com uma vitória World Tour, e ainda Johannes Staune-Mittet (Noruega; Jumbo-Visma), Harold Martin Lopez (Equador; Astana), Marco Frigo (Itália, Israel Premier-Tech), Santiago Umba (Colômbia; Drone Hopper – Androni Giocattoli), Igor Arrieta (Espanha, Kern Pharma) e Georg Steinhauser (Alemanha, EF Education-Easy Post). Qualquer um destes rapazes é rapaz para terminar nos dez mais.
Quanto à luta pela camisola verde deve cair para um destes nomes: Thibau Nys (Bélgica; Trek-Segafredo), Casper Van Uden (Países Baixos; DSM), Jensen Plowright (Austrália; Groupama-FDJ), Blake Quick (Austrália; Trinity Racing), Matevž Govekar (Eslovénia; Bahrain-Victorious), Søren Wærenskjold (Noruega; Uno-X) e Nicolas David Gomez (Colômbia; Team Colpack Ballan).
Se nenhum dos corredores referenciados ao longo deste artigo — e que participam no Tour de l’Avenir 2022 — ganhar uma grande volta, ou tornar-se um belo sprinter e potencial vencedor da camisola da regularidade, algo está podre no reino do ciclismo mundial.