Antevisão — La Flèche Wallonne
Huy, que afinal o Pogačar não ganha sempre.

Introdução
Tenho um certo carinho por esta clássica. Sobretudo por algumas edições especificas. Assim de repente, vêm-me à cabeça, de forma completamente aleatória e imparcial, anos como os de 2018, 2019 e 2021. Não faço ideia porquê.
Esta semana das Ardenas esperava-se previsível, como o meu estimado colega Miguel Pratas deixou claro no subtítulo da antevisão da Amstel Gold Race — "Fuga controlada pela UAE Emirates. Ataque de Pogačar algures nos últimos 100 quilómetros. Fim.". No fundo, era o que todos esperávamos. E você também, querido leitor que depois de almoço é que oferece a sopa quando emproado proclama que "claro que ele se ia ressentir dos esforços do empedrado e bla bla bla". Isso são regras que se aplicam somente aos humanos, e Tadej Pogačar já há muito não dava sinais da sua humanidade.
O que se passou no Domingo passado abriu e de que maneira o apetite para esta Flèche e para a Liège de Domingo. Isto porque, aparentemente, Pogačar não é imbatível. E uma corrida quando o vencedor não é certo antes do arranque tem sempre outro gosto. Obrigado por isso, Remco. Parabéns, Skjelmose.
O 2.º round terá então lugar no mítico Mur de Huy, onde se nomeia anualmente o melhor puncheur do mundo. Hoje em dia os melhores puncheurs são os voltistas, o que tira parte da essência à coisa, mas é fruto da geração canibal que temos a sorte de disfrutar atualmente. Skjelmose provou que, com a tática perfeita e boas pernas, se pode bater os aliens. E que ótima noticia isso representa para o ciclismo.
Acontecerá outra vez?

O percurso
Não tem muito que inventar. Para quem já anda cá há algum tempo o percurso da Flèche é tão surpreendente como uma queda do Roglič, o João dizer que teve um dia mau quando vence ou Marezcko vencer provas na Ásia.
100 quilómetros iniciais levam-nos à entrada do circuito final, composto por 3 subidas principais que são ultrapassadas por 3 vezes cada uma.

A primeira das subidas a ultrapassar no circuito é Côte d'Ereffe (2.1km a 5.6%), seguindo-se o já mais puxadinho Côte de Cherave (1.3km a 7.6%). Apesar das múltiplas voltas e subidas, tradicionalmente todas as decisões ficam para a ascensão final ao Mur de Huy, que coincide com a meta.

Digo tradicionalmente porque isto agora é tudo maluco. E eu estou na ideia que amanhã vai ser mais um exemplo disso.
O que esperar
Penso que, mais do que em qualquer outra edição recente, há razões para acreditar que a corrida poderá ser mexida desde mais longe e as decisões não se ficarem pelo Mur de Huy, como normalmente acontece. É verdade que o Tadej deve ter ficado escaldado com a Amstel e pode ter perdido alguma confiança nos seus solos infinitos, mas também é verdade que eu duvido muito que Remco Evenepoel confie nas suas capacidades para bater o esloveno num mano-a-mano explosivo de 1 quilómetro. Por isso, não me admiraria nada de ver o belga atacar, por exemplo, na penúltima passagem pelo Mur de Huy, e Tadej Pogačar ver-se obrigado a responder. Foi notório que o esloveno acusou algum desgaste pelo que será do interesse dos restantes contenders meterem o máximo de peso possível nas suas pernas. Se assim for, Remco poderá procurar aliados em outros nomes sem o punch suficiente para vencer esta prova numa única subida - como Ben Healy, Benoot, Pidcock ou Ben O'Connor - e tentar provocar o caos na corrida, sobretudo aqui que a equipa da UAE não é super.
Embora eu acredite que vai ser mais animado do que é costume, a minha convicção continua a ser que chegaremos à base da última subida com um grupo para discutir entre si a vitória. Pode é ser de 10 elementos, ao contrário dos habituais 80. Esse tipo de situações são sempre mais propicias a surpresas ou ataques bem sucedidos mas, ainda assim, normalmente é quem tem mais pernas que ganha. E, normalmente, quem tem mais pernas é Tadej Pogačar. Ainda por cima de orgulho ferido.
Favoritos
Tadej Pogačar — Sim, deixo-o aqui, a solo, na categoria dos favoritos. É esse o meu nível de confiança em como não perde outra vez, agora que está na pior sequência dos últimos anos da carreira (3.º Milano Sanremo; 1.º Flandres; 2.º Roubaix; 2.º Amstel — para outros seria career year, para ele são 3 derrotas em 4 corridas, mais do que em 2024 inteiro). As pernas devem estar pesadas, os adversários sentiram nele alguma vulnerabilidade, deve ser obrigado a correr de forma mais conservadora mas no fim espero um Tadej a festejar.
A não perder de vista
Remco Evenepoel — Não sou simpatizante mas sou apoiante. Apoiante porque este rapaz faz bem ao ciclismo. Corre para ganhar, sem medos, diz tudo o que lhe vem à cabeça e tem um motor que nunca mais acaba. Sentiu o cheiro a sangue no Domingo mas viu a vitória escapar-lhe por entre os dedos. Vai voltar a tentar, eu acredito que de longe, mais não seja porque prefere rebentar do que terminar a pensar que poderia ter feito mais.
Thibau Nys — Diz-se por aí que é o objetivo dele e que ele pode ser o futuro deste tipo de provas. Diz o Rogério, diz o Skjelmose e diz o Valadas. Eu não estou assim com tanta fé, para já, embora este rapaz quando está bem seja impressionante e já o mostrou vezes sem conta. Mas depois aparece no País Basco a arrastar-se e é dropado no Cauberg na Amstel e uma pessoa fica de pé atrás. Se a corrida for endurecida de longe, acho que está out, se deixarem tudo para o quilómetro final, cuidado com ele.
Mattias Skjelmose — Ao contrário do colega, quererá a corrida dura desde longe. E se a corrida partir, pode sempre usar a carta de "tenho o Nys atrás, não vou trabalhar". Não é habitual, mas o raio às vezes cai duas vezes no mesmo sitio e este jovem dinamarquês careca é um perigo à solta já com resultados nesta prova — foi 2.º em 2023 e uma gelatina em 2024.
Julian Alaphilippe — Allez Loulou. Eu tenho sempre a esperança que tu ainda tenhas grandes momentos para nos dar, e em que outro sitio que não aqui, onde mais felizes fomos? Aos quilómetro 205 da Amstel ele estava na frente, a Flèche tem 205 quilómetros. Só não vê quem não quer.
Lenny Martinez — A vitória no Paris-Nice impressionou-me e deixou-me logo a pensar neste dia.
Menções honrosas — Romain Grégoire, Thomas Pidcock e Lennert van Eetvelt.
Apostas falso plano
André Dias — Thibau Nys. A ver se alguém aprende a dizer o nome.
Fábio Babau — Tadej Pogačar. Huy Huy Huy.
Henrique Augusto — Se ele perder outra vez, começo a ficar preocupado.
O Primož do Roglič — O meu menino, Grégoire.
Miguel Branco — Lennert Van Eetvelt. Ele tem ponta final.
Miguel Pratas — Tadejandro Pogaverde.
Nuno Gomes — Eduardo Sepúlveda chega na forma da vida dele. Just saying.
Rogério Almeida — Um estreante a ganhar.